O telefone do presidente da Petrobras, José Sergio
Gabrielli, não parou de tocar na manhã desta segunda (23), depois de
confirmada sua saída do comando da empresa, marcada para 13 de
fevereiro. Em uma das ligações, ouviu o convite do governador Jaques
Wagner (PT) para voltar à Bahia e integrar o alto escalão do Palácio de
Ondina. Acertou a nomeação para depois do Carnaval, provavelmente março,
mas dois detalhes ficaram fora da conversa: o cargo e o real motivo da
troca de comando.
Aos olhos do público, a saída de Gabrielli vem sendo
tratada como parte de um projeto político pessoal do executivo: o de se
candidatar ao governo do estado em 2014. “Era uma coisa que estava
combinada entre a presidente, Gabrielli e Wagner, que foi responsável
pela indicação dele para o cargo”, relatou o deputado estadual Rosemberg
Pinto (PT), amigo e um dos maiores aliados do baiano.
No entanto, a decisão da presidente tem muito mais
relação com antigas divergências entre ela e Gabrielli do que com o pano
de fundo eleitoral montado pelos seus correligionários. Nos
bastidores, era conhecida a birra de Dilma com o executivo, com quem
discutiu rispidamente diversas vezes quando ocupava o Ministério das
Minas e Energia e tentava interferir na gestão de Gabrielli, famoso por
resistir às investidas de integrantes do Planalto.
Gabrielli sai da Petrobras e vai se preparar para eleições
Um dos episódios famosos no anedotário político de
Brasília revela o tamanho da tensão que acompanhava os contatos entre os
dois. Em 2008, Gabrielli foi convocado para uma reunião com Dilma,
então chefe da Casa Civil. Preocupada com a crise internacional que
abalou os mercados, ela queria saber como andavam as aplicações
financeiras da Petrobras.
Gabrielli teria afirmado que a Petrobras não seria
atingida, porque não operava com papéis de risco e que, se isso fosse
comprovado, ela poderia arrancar um olho dele. Dilma, então respondeu
que, caso constatasse a existência de aplicações temerárias da empresa,
arrancaria os dois olhos. Para azar do baiano, a estatal acabou
socorrida pela Caixa em cerca de R$ 2 bilhões, já que foi atingida pelo
terremoto financeiro.
Outros sinais servem para desmontar a tese de que a
saída de Gabrielli tem como horizonte apenas a sucessão estadual. Mesmo
sabendo há mais de um ano que Dilma queria vê-lo fora da estatal, o
petista esperava que a troca de comando ocorresse após as eleições deste
ano. Assim, teria tempo para se vitaminar à frente da estatal, além de
manter o salário de R$ 60 mil, fora os bônus milionários. No governo da
Bahia, vai receber R$ 12 mil.
Indefinições
Após ser informado de que
teria de ceder a cadeira para a preferida de Dilma, a diretora da
Petrobras Maria das Graças Foster, Gabrielli acabou aceitando a proposta
de Wagner. Disse se sentir honrado com a possibilidade de trabalhar no
governo estadual, mesmo sem saber para onde vai.
“O governador falou com ele, o convidou para ocupar
uma posição na equipe e Gabrielli aceitou. Mas não conversaram
especificamente sobre qual área será. Isso vai depender de ajustes, que
só deverão ocorrer entre o fim de fevereiro e o início de março”,
informou o secretário de Comunicação Social, Robinson Almeida.
Em meio ao silêncio, as apostas continuam girando em
torno de três secretarias: Fazenda, a menos provável, Planejamento e
Indústria, Comércio e Mineração, ambas com maior visibilidade política.
Com a ida para o governo estadual, Gabrielli vai aproveitar o cargo para
se capitalizar eleitoralmente.
O próprio governador declarou diversas vezes que, se
quisesse ganhar musculatura, o petista devia voltar à Bahia. Coisa que o
executivo fazia com frequência. Ao longo de 2011, Gabrielli não perdia a
oportunidade de aparecer em grandes eventos da empresa e em atos
políticos do PT baiano, sempre sob aplausos da claque de petroleiros.
“O grande empecilho para o projeto de Gabrielli era
estar fora da Bahia. Agora, o caminho fica pavimentado, mas ainda
estamos longe de 2014. No momento, ele vai se concentrar em ajudar o
governo”, complementou Rosemberg.
Nova presidenta da Petrobras ocupa atualmente a Diretora de Gás e Energia da estatal
Nas graças da amiga Dilma
Em março de
2011, a presidente Dilma Rousseff veio a Salvador anunciar investimentos
na construção de um terminal de gás na Baía de Todos os Santos, mas
acabou revelando um desejo guardado desde que começou a caminhada rumo
ao Palácio do Planalto: o de ver uma mulher no comando da Petrobras. Ao
lado, estava a diretora de Gás e Energia da estatal e sua amiga pessoal,
Maria das Graças Foster. O recado estava dado.
Quase um ano depois, a Petrobras só fez confirmar o
que já estava traçado. Em 13 de fevereiro, Graça Foster, como é
conhecida nas rodas do poder, vai entrar para a história como a primeira
presidente da empresa, da mesma forma que a amiga Dilma entrou ao
suceder Luiz Inácio Lula da Silva. Contudo, as semelhanças entre elas
não estão restritas apenas aos feitos históricos.
Mineira como Dilma, mas carioca por opção, Graça é
descrita como dona de um estilo duro, do tipo “gerentona”, sobretudo no
trato com subordinados e na maneira obcecada com a qual persegue metas e
resultados, assim como a presidente. Aos 58 anos, mãe de dois filhos e
avó de uma neta, a exemplo da amiga, a engenheira química formada pela
Universidade Federal Fluminense, com MBA em Economia pela Fundação
Getúlio Vargas, também é reservada na vida particular. Não frequenta
círculos sociais e evita ao máximo dar entrevistas.
A similaridade de temperamento aproximou as duas,
que se conheceram em 2000, durante uma visita feita por Graça,
funcionária de carreira da Petrobras, ao gabinete de Dilma Rousseff,
então Secretaria de Minas e Energia do Rio Grande do Sul. Em janeiro de
2003, a engenheira foi convidada a ocupar a Secretaria de Petróleo, Gás
Natural e Biocombustíveis do Ministério das Minas e Energia, comandado
por Dilma, com quem estreitou laços de amizade.
Em 2005, Dilma deixou o ministério em junho para
assumir a Casa Civil da Presidência no lugar de José Dirceu. Graça
também ficou nas Minas e Energia: em setembro, voltou ao Rio, alçada à
presidência da Petroquisa, subsidiária da Petrobras no setor
petroquímico, de onde saiu para presidir a BR Distribuidora. Em 2007,
ela assumiu a Diretoria de Gás e Energia da Petrobras, cargo que acumula
com o comando do braço da estatal na área de Gás, a Gaspetro. Sua
atuação recebeu sucessivos elogios da chefe, sobretudo pela obstinação
em ampliar a oferta do produto no mercado.
Com a eleição de Dilma, Graça ganhou o centro das
especulações em torno da montagem do novo governo. Ao longo do período
de transição, pipocaram notícias que asseguravam sua presença na cúpula
do Planalto ou mesmo na presidência da Petrobras. Veio 2011 e ela
permaneceu na mesma cadeira. Mas já sabia que aquele desejo revelado
pela presidente em Salvador viraria realidade em breve.
Troca em momento de baixa
A
nova presidente da Petrobras vai assumir num momento em que o mercado
“pune” a companhia por dar um preço para suas ações abaixo do potencial
de crescimento da empresa. O motivo é, principalmente, a capitalização
realizada em 2010, que, ao aumentar a participação da União na empresa,
elevou também a possibilidade de ingerência política em sua gestão.
O resultado é que o valor de mercado da estatal caiu
por dois anos seguidos, em 2010 e 2011, embora comece a esboçar reação.
No fim de 2005, ano em que José Sergio Gabrielli assumiu, a companhia
estava avaliada em R$ 171,4 bilhões. Com o pré-sal, chegou ao pico de R$
429,9 bilhões em 2007. Fechou 2011 em R$ 291,6 bilhões, reagiu nos
primeiros dias de 2012 e valia R$ 331,8 bilhões na sexta-feira. O valor
das ações caiu 23% em 2010 e 18,3% em 2011.